O futuro da Embraer e dos empregos depende de sua reestatização

*Por Toninho Ferreira


Os trabalhadores da Embraer e do setor aeronáutico se veem novamente diante de um futuro incerto após a ruptura do acordo com a Boeing e com a crise no setor da aviação mundial em razão da pandemia. Uma situação que ameaça os empregos, bem como a existência da própria empresa e fornecedoras.

A venda à Boeing não se concretizou, mas a direção da Embraer e os acionistas trataram as negociações como “favas contadas” nos últimos dois anos e tomaram medidas temerárias para preparar a empresa aos norte-americanos. Paralisaram investimentos, realizaram demissões, reestruturações, cortes de custos e abandonaram a criação de novos projetos, que impuseram grandes prejuízos e colocaram a Embraer em uma situação extremamente vulnerável, que se agrava num cenário altamente competitivo.

O mercado mundial de aviação é dominado por grandes monopólios, que recebem volumosos aportes do Estado, e marcado por forte competitividade. Não é à toa. O setor é estratégico para o desenvolvimento tecnológico e para a soberania de qualquer país.

Mas a quase venda da Embraer revela que seus acionistas, em sua maioria, grandes fundos de investimentos estrangeiros, não se importam com os interesses do povo brasileiro. Eles não pensaram duas vezes em abrir mão do principal e mais dinâmico negócio da Embraer, mesmo que isso fosse representar a desnacionalização completa da empresa e sua destruição em pouco tempo. No máximo, seria transformada numa montadora de peças de aviões.

O fortalecimento da Embraer no mercado internacional só pode se dar com uma política exatamente contrária ao que os defensores da venda da empresa tentaram fazer.

Existe atualmente uma necessidade de aeronaves comerciais de curta distância que poderia ser explorada pela Embraer no mundo todo ou ainda a diversificação de sua produção, com mais desenvolvimento tecnológico. Porém, nas mãos do setor privado, a busca pelo lucro rápido, sem relação com um projeto de soberania nacional, seguirá fragilizando a empresa e resultando na sua destruição.

Daí que o futuro da Embraer só é possível com sua reestatização.

Ela foi construída com o trabalho e o dinheiro do povo brasileiro e, mesmo depois de privatizada em 1994, seguiu sendo financiada com recursos do BNDES. Foram mais de US$ 14 bilhões entre 1997 e 2014.

Reestatizar a Embraer é devolver a empresa às mãos do povo brasileiro e direcionar dinheiro público para uma empresa pública, a serviço dos interesses nacionais e não de um punhado de acionistas estrangeiros.

O Brasil precisa inverter a lógica atual, investir em pesquisa e barrar imediatamente o ciclo de desindustrialização, para que o país deixe de ser apenas extrativista e exportador de commodities, como nos tempos do Brasil colônia.

Contudo, é preciso que os trabalhadores discutam também sobre que tipo de reestatização é necessária. Afinal, o capitalismo não se nega a estatizar empresas quando isso é do seu interesse.

Foi assim quando Barack Obama, na crise de 2008, adquiriu 60% do controle acionário da GM para salvá-la da bancarrota, e anos depois devolvê-la sanada e lucrativa ao setor privado. Ou mesmo como ocorre neste momento, em que o governo da Itália caminha para estatizar a companhia aérea Alitália, e a Alemanha injetará US$ 9,8 bilhões para adquirir ações da Lufthansa.

Mesmo o ministro Paulo Guedes fala agora em socorrer os acionistas da Embraer com R$ 3,3 bilhões, e o PT, através do senador Jacques Wagner, propôs um projeto para que o governo passe a ter o controle acionário da empresa, mas que mantém o lucro e decisões estratégicas nas mãos dos fundos acionistas.

Já o governo de Bolsonaro e Mourão se negou a usar a chamada ação Golden Share para vetar a transação com a Boeing e agora, após o fracasso da negociação, tem declarado que busca outros parceiros internacionais para a aquisição da Embraer, em mais uma demonstração de que esse governo de ultradireita, subordinado ao imperialismo, é incapaz de defender os interesses dos trabalhadores e do país.

Nós, do PSTU, defendemos que a Embraer precisa ser reestatizada, com controle 100% estatal e sob a direção dos trabalhadores.

Os funcionários da Embraer produzem a riqueza da empresa, detêm todo o conhecimento científico e operacional da produção de aviões. São os únicos que têm interesse e, de forma democrática, podem impedir a corrupção, defender os empregos e buscar o desenvolvimento científico em prol dos interesses nacionais.

O Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e região lançou uma campanha nacional, que já conta com um manifesto com mais de 250 assinaturas, entre entidades da sociedade civil, personalidades políticas e lideranças dos movimentos sindical e social. É preciso fortalecer essa campanha.

A luta pela reestatização da Embraer trata-se da defesa de milhares de empregos, de manter uma empresa nacional de aviões, pública, de excelência tecnológica, a serviço do desenvolvimento econômico e social e da soberania do país.

*Presidente do PSTU de São José dos Campos, ex dirigente do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região, ex-funcionário da Embraer


Publicado originalmente em OVALE, 04/06/2020: https://www.ovale.com.br/_conteudo/ideias/2020/06/105811-toninho-ferreira---o-futuro-da-embraer-e-dos-empregos-depende-de-sua-reestatizacao

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