Embraer: Emprego e soberania só com reestatização e controle dos trabalhadores

Por Toninho Ferreira*
O anúncio da Boeing sobre a desistência de comprar a área de aviação comercial da Embraer, no último dia 25 de abril, caiu como uma bomba no cenário político e econômico, nacional e internacional. A reviravolta ocorreu após quase dois anos de negociações entre as empresas e quando já se considerava a transação como concretizada.
Os problemas enfrentados pela Boeing, como o fracasso de vendas do seu modelo 737 Max, e o aprofundamento da crise econômica mundial em razão da pandemia explicam o rompimento unilateral do acordo. Contudo, o negócio representava um desastre para os trabalhadores e o país desde o início. A fabricante brasileira perderia o filé mignon de suas atividades, que é a área comercial, e deteria apenas 20% da nova empresa que seria criada pela Boeing.
O Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e região, junto com outros sindicatos, organizações e especialistas do setor, denunciaram que a venda era um crime de lesa-pátria, que geraria milhares de demissões e acabaria com o potencial tecnológico da Embraer.
Ao contrário de ser a salvação da empresa como alegavam, na prática seria a desnacionalização completa da fabricante brasileira, num avanço ainda maior do processo de recolonização do país e de perda de soberania a serviço dos interesses dos Estados Unidos.
Reestatização e nacionalização da Embraer
O fim do acordo com a Boeing abriu um debate sobre o futuro da empresa. O governo de Bolsonaro e Mourão se negou a usar a chamada ação Golden Share, que poderia ter vetado a transação com a Boeing. Agora, após o fracasso da negociação, tem declarado que busca outros parceiros internacionais para a aquisição da empresa. Mais uma demonstração de que esse governo é incapaz de defender os interesses dos trabalhadores e do país.
Já há alguns anos que as ações da Embraer são negociadas nas bolsas de valores, como a de São Paulo e de Nova Iorque. A maioria está nas mãos de grandes fundos de investimento e bancos dos Estados Unidos, como Brandes Investment Partners (15%), Mondrian (10%), BlackRock (5%), J. P. Morgan, Morgan Stanley, Credit Suisse, entre outros.
São os interesses dos acionistas estrangeiros que vêm ditando as decisões da empresa, que avançam cada vez mais para sua desnacionalização e sua transformação em mera montadora de componentes, pois visam apenas o lucro rápido e fácil, como seria a venda para a Boeing. Tudo, porém, financiado com dinheiro público.
A Embraer é uma das maiores empresas de aviação do mundo, detém tecnologia de ponta e cumpre um papel estratégico para o país. Foi construída com o trabalho e o dinheiro do povo brasileiro e, mesmo depois de privatizada em 1994, seguiu sendo financiada pelo dinheiro público através de financiamentos do BNDES. Foram mais de US$ 14 bilhões entre 1997 e 2014. É uma empresa estratégica e deve ser encarada como um patrimônio nacional. Apenas nove países no mundo dominam essa tecnologia.
Reestatização sob controle dos trabalhadores
É hora de discutir não só a reestatização da Embraer, mas o controle dos trabalhadores. O repasse de mais dinheiro público, sem a completa estatização, somente vai garantir os lucros de acionistas estrangeiros. Enquanto a Embraer estiver a serviço de interesses privados, os trabalhadores seguirão sofrendo com a ameaça das demissões em massa e a falta de um projeto estratégico que permita um desenvolvimento tecnológico, econômico e soberano.
São os trabalhadores que produzem a riqueza da empresa, detêm todo o conhecimento científico e operacional da produção de aviões. São os únicos que têm interesse, de fato, em defender os empregos e no desenvolvimento do país. Existe uma necessidade de aviões comerciais de curta distância. Mas os interesses das multinacionais impedem a viabilidade da empresa. Os trabalhadores é que devem decidir os modelos de aeronaves e toda a produção. Para isso, a Embraer precisa ser reestatizada, com controle 100% estatal e sob a direção dos trabalhadores.
A luta pelo emprego não apenas da Embraer, mas de todos os trabalhadores da cadeia produtiva do setor aeronáutico, somente pode ser garantida pela reestatização. Para isso, é preciso que todos os sindicatos do país, as centrais sindicais e os partidos que defendem a soberania nacional a se engajarem numa grande campanha para que a empresa volte a ser estatal.

*Presidente do PSTU de São José dos Campos, ex dirigente do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região, ex-funcionário da Embraer

Publicado originalmente em OVALE (https://www.ovale.com.br/_conteudo/ideias/2020/05/103982-toninho-ferreira---embraer--emprego-e-soberania-so-com-restatizacao-e-controle-dos-trabalhadores.html)