Mais uma mesma lei de zoneamento

30/08/2019 -  A Prefeitura de São José dos Campos já enviou à Câmara o projeto da nova Lei de Zoneamento. 

Todos os municípios do país que tem mais de 20.000 habitantes são obrigados a ter um Plano Diretor, que também é uma lei, através da qual o governo da cidade demonstrará qual a política de desenvolvimento e expansão urbana será adotada para os próximos dez anos.

Isso se deve a um dispositivo da Constituição Federal, que também diz que essa política urbana deve ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.

A lei de zoneamento, portanto, é consequência direta do Plano Diretor, que, por sua vez, deve obedecer à Constituição e, no final, garantir o bem-estar das pessoas.

O problema é que, apesar desses nobres propósitos, os governos municipais acabam por privilegiar a atividade econômica e dar pouca ou nenhuma atenção à vida dos habitantes, especialmente os mais pobres.

Aqui em São José dos Campos não é diferente e essa nova lei também veio para possibilitar aos empresários expandir seus negócios.

Aparências enganam

Quem lê a lei, especialmente no início, pode achar que existe mesmo uma preocupação do governo municipal com a qualidade de vida das pessoas.

Além dos maravilhosos objetivos da lei, expostos já no art. 3º, há outros aspectos que dão a impressão de que haverá um avanço na área social, mas que não passam disso, só impressão.

O texto do projeto da lei está recheado de temas ambientais, como preservação de biomas, da vegetação remanescente da Mata Atlântica, proteção de Áreas de Preservação Permanentes e outras de interesse ecológico.

Por  outro  lado,  ao  lado  dessa  temática,  encontramos  todas  as  medidas  necessárias  à intervenção  econômica  nessas  áreas,  desde  autorização,  licenciamento  e  medidas  de mitigação. 
Ora,  se  está  assegurada  a  preservação,  o  local  jamais  poderá  sofrer,  por  exemplo, parcelamento do solo, mesmo que sob autorização de quem quer que seja. E se vai sofrer parcelamento,  é  impossível  estabelecer  requisitos  para  sua  preservação,  que  já  foi comprometida com o próprio parcelamento.

Assim, o que parece ter uma grande preocupação ambiental, é contraditório em si mesma e acaba levando a gente a concluir que, apesar de reconhecer a importância desse ecossistema urbano, a prefeitura vai autorizar todo e qualquer empreendimento, desde que o empreendedor se comprometa a preservar o local.

Foi também mantida a Outorga Onerosa do Direito de Construir. Em poucas palavras, significa o seguinte: A lei impõe uma série de limitações para as construções na cidade, como o tamanho máximo da área construída em relação ao terreno.

Isso parece bom, porque impede que as construções tenham um tamanho incompatível com o bem-estar das pessoas que moram nas redondezas. Só que, se a construção ultrapassar esse limite, basta o empreendedor pagar uma determinada importância à prefeitura e a obra poderá ficar maior.
Assim, se há um limite técnico para a construção, justamente para, ao menos em tese, possibilitar a harmonia com a vida do local, não há dinheiro que traga essa harmonia de volta.

Sem preocupação social

A nova lei não deixa espaço para a melhoria das condições sociais e ainda mantém a política de apartheid existente, principalmente porque não cria novos espaços de convivência. As áreas públicas serão mais limitadas e menos acessíveis. Só quem mora em condomínios terá seu espaço comunitário garantido e, assim mesmo, não mais que 15% da área total.

A prefeitura entregou à iniciativa privada a construção de habitações populares.

A nova lei não deixa espaço para a melhoria das condições sociais e ainda mantém a política de apartheid existente, principalmente porque não cria novos espaços de convivência. As áreas públicas serão mais limitadas e menos acessíveis. Só quem mora em condomínios terá seu espaço comunitário garantido e, assim mesmo, não mais que 15% da área total.

A prefeitura entregou à iniciativa privada a construção de habitações populares.

Há na lei toda uma regulamentação para loteamentos especiais de interesse social, que seriam destinados apenas àquelas pessoas que estão inscritas no programa habitacional da cidade, que, na verdade, é a famosa fila por moradia, já que não há propriamente um programa habitacional no município. 

Com o estabelecimento de regras para a implantação desses  loteamentos, destinadas a empreendedores privados, a prefeitura tira de si a responsabilidade de suprir as necessidades de moradia dessa gente toda. Além disso, condiciona a construção de moradias à lucratividade das obras e abre caminho para terceirizações, como já temos no setor de saúde. 
E, ainda, a cidade permanece sem nenhuma ZEIS – Zona Especial de Interesse Social.
Essas ZEIS’s são criadas para regularizar assentamentos irregulares, como loteamentos chamados de clandestinos e ocupações. 

O que a prefeitura fez foi condicionar a criação de ZEIS à regularização fundiária, quando deveria ser o contrário. 

Em resumo, o projeto da nova lei de zoneamento, apesar da aparência, não vai propiciar pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. 
Trata-se  de  mais  um  instrumento  legal  visando  atender  a  demanda  de  empresários, principalmente do setor imobiliário, acarretando uma diminuição substancial do espaço público, que passará a ser cada vez mais privado. 


É, em síntese, a mesma antiga lei, mas agora pintada de verde.

Por: Denis Ometto
Advogado,
militante do PSTU